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Conflito na Síria: a primavera que não consegue se estabelecer

A Síria está atravessando um período bastante turbulento com o crescimento das revoltas contra o governo de Bashar al-Assad. Mesmo com as sanções impostas pela ONU, o presidente sírio não abre mão do poder e a escalada de violência aumenta a cada dia.





 
Bandeira da Síria
Desde o início dos protestos sociais em março de 2011, a Síria atravessa um momento de grave tensão social. A maioria da população corresponde aos sunitas, divisão do islamismo que abrange cerca de 90% dos islâmicos do mundo. O presidente sírio Bashar al-Assad pertence à seita islâmica alauita, uma vertente dos xiitas. Os alauitas podem ser considerados como a elite econômica e política da Síria, possuindo também uma posição privilegiada nas forças armadas. O governo sírio é apoiado pelo Irã, país de maioria xiita e que é declaradamente opositor à dominação geopolítica do ocidente na região. Recebe também grande influência do grupo xiita Hezbolah, milícia islâmica que luta pela criação de um Estado palestino e que recentemente assumiu o poder no vizinho Líbano.
Bashar al-Assad chegou à presidência no ano de 2000 após o falecimento de seu pai, Hafez al-Assad, prometendo uma série de reformas que nunca foram realizadas. O partido Ba’ath governa a Síria desde 1963 e pouco tempo depois que chegou ao poder impôs censura à imprensa e decretou um Estado de Emergência, que é quando o governo pode tomar medidas que contrariam os direitos civis em nome dos ideais do Estado, efetuando prisões, impondo toques de recolher, entre outras medidas.
Atualmente o país é governado por uma espécie de cartel formado por governistas e empresários. Algumas reformas políticas foram realizadas nos últimos anos, mas não foram suficientes para impedir as manifestações da população civil que começaram na cidade de Deraa, ao sul, e que se espalharam por todo o país. A violência aumentou muito, e os dados da ONU indicam ao menos 10.000 mortes em 1 ano de conflito.
Ao final do mês de abril de 2011, o governo encerrou o Estado de Emergência que vigorou no país por 38 anos, afirmando que as manifestações políticas pacíficas seriam permitidas no país. Após a projeção internacional da crise, o líder sírio tentou convencer a ONU que as ações contra os manifestantes não eram intensas, diferente das informações que os rebeldes e os opositores em exílio expuseram para a comunidade internacional. ONU e Liga Árabe procuraram saídas diplomáticas e negociaram um cessar-fogo que aparentemente não foi praticado. Os bombardeios contra os focos de resistência rebelde ainda são constantes.
As deserções de soldados sírios começaram a ajudar os opositores, que pretendem criar um conselho transitório de governo. Os principais alvos dos rebeldes são os símbolos do poder do governo, como delegacias e tribunais. As cidades de Aleppo (a mais populosa e importante) e a capital Damasco concentram a maior parte dos confrontos. O número de refugiados já ultrapassa a marca de 250 000 indivíduos, a sua maioria em direção à Jordânia.
Os Estados Unidos parecem não querer interferir diretamente na questão Síria por entenderem o momento inoportuno para encarar o Irã, que pode se sentir ameaçado ao ver o ocidente interferindo nas políticas internas do seu aliado. Além disso, a característica apresentada pelo governo norte-americano de Barack Obama é evitar “novos Iraques”, isto é, guerras dispendiosas do ponto de vista financeiro e humano. Há uma disposição por parte da ONU de tomar medidas mais drásticas contra Bashar al-Assad, que são veementemente refutadas por China e Rússia, países que possuem em seus territórios conflitos separatistas e etnias que buscam autonomia. Várias sanções políticas e econômicas já foram impostas, como o congelamento dos bens do Estado sírio e a suspensão da comercialização do petróleo, principal produto exportado pelo país. A saída de al-Assad é algo inevitável, mas pode ceifar milhares de vidas até a sua consumação.



Conflitos na Síria e intervenção dos EUA

Em guerra desde que os ventos da Primavera Árabe sopraram em seu território, a Síria corre o risco de se transformar em um novo Iraque, com a possível ação armada dos EUA.


 
Cenas da destruição causada pela guerra, em Serekaniye, na Síria.*
A notícia de que foram utilizadas armas químicas por parte do exército da Síria, em 21 de agosto de 2013, em Gouta, no subúrbio da capital Damasco, foi transmitida por diversos veículos de comunicação do mundo ocidental, aumentando o alerta sobre os conflitos armados que ocorrem no país. A preocupação aumentou após o atual presidente dos EUA, Barack Obama, anunciar a intenção de bombardear o país árabe, com o objetivo de derrubar o presidente sírio Bashar Al-Assad, apontado como responsável pelo uso das bombas com gás sarín.
Para o vestibulando, o interesse em conhecer mais sobre o conflito está relacionado a duas possibilidades: as ações de intervenção armada dos EUAno Oriente Médio e os conflitos políticos e militares decorrentes do que ficou conhecido comoPrimavera Árabe.
Começaremos pela segunda possibilidade. A Primavera Árabe foi o nome dado a uma onda de revoltas que ocorreu no Norte da África e Oriente Médio a partir de dezembro de 2010. Apesar de ter iniciado no inverno do Hemisfério Norte, a menção à primavera é feita em alusão à Primavera de Praga, ocorrida em 1968. O evento que iniciou as revoltas que sacudiram – e ainda sacodem – os países das duas regiões foi a imolação de um jovem tunisiano contra o governo de seu país. A partir daí, uma série de revoltas tomou conta dos países, resultando na queda de vários governos, como na própria Tunísia. Mas os casos mais emblemáticos ocorreram no Egito, com o fim do governo de Hosni Mubarak, e na Líbia, com a queda e a morte de Muammar Gadaffi.
A Síria não ficou de fora dessa onda de protestos. Em março de 2011, a população síria saiu às ruas das cidades do país, pedindo o fim do regime político comandado por Bashar Al-Assad. A não aceitação das reivindicações e a repressão efetuada pelas forças militares de Al-Assad aumentaram as tensões políticas, levando a oposição a empreender uma luta armada contra o governo.
Bashar Al-Assad chegou ao poder em 2000, após a morte de seu pai, Hafez al-Assad, que havia iniciado seu comando no país durante a década de 1970. Os dois representam os alauítas na Síria, uma minoria que professa o islamismo e compõe cerca de 10% da população. A organização política que sustenta o poder dos Al-Assad é o partido Baath, a renascença, que tem como parte de sua doutrina o nacionalismo árabe e o anti-imperialismo. Essa postura levou o país a se opor às políticas dos EUA no Oriente Médio, como também às ações do Estado de Israel, país que havia tomado do estado sírio as colinas de Golã, em 1967, durante a Guerra dos Seis Dias.
 










O governante sírio Bashar Al-Assad.**



Bashar Al-Assad pretendeu em seu governo iniciar medidas de abertura política, como a libertação de presos políticos, mas que se mostraram muito limitadas. Com a manutenção de limitações à participação política da população, os eventos da Primavera Árabe insuflaram a oposição ao regime. A luta iniciou-se pelos direitos de autodeterminação do povo sírio. Porém, os desdobramentos dos conflitos militares entre as forças de oposição e as forças militares do governo de Al-Assad passaram a envolver uma série de países, com interesses na Síria e no Oriente Médio.
Os países ocidentais, principalmente os EUA, França e Reino Unido, declararam apoio às forças de oposição, denominadas pela imprensa de forças rebeldes. Elas estão organizadas principalmente naCoalizão Nacional Síria da Oposição e das Forças Revolucionárias (CNSOFR), formada por diversas organizações. O governo dos EUA inclusive chegou a reconhecer, em dezembro de 2012, a CNSOFR como representante legítima da Síria, pretendendo deslegitimar o governo de Al-Assad, e criou ainda o Grupo de Apoio Sírio (Syrian Support Group, SSG, em inglês), uma entidade destinada a angariar recursos financeiros e apoio não letal para apoiar o Exército Livre Sírio (ELS), a principal organização da CNSOFR.
O ELS foi formado principalmente por desertores das Forças Armadas Sírias, que passaram para a oposição ao regime. Porém, especialistas apontam um grande número de mercenários que combatem no ELS, contratados principalmente pela empresa de segurança estadunidense Acadmi (antiga Blackwater), que conta com antigos combatentes das guerras nos Balcãs, Afeganistão e Iraque, por exemplo.
Mas há também na Coalização forças ligadas a grupos islâmicos, cujos guerreiros, os mujahidin, estariam combatendo pelo jihad, a guerra santa muçulmana. Os grupos islâmicos estão organizados na Frente Síria de Libertação Islâmica, próximos à Irmandade Muçulmana; a Frente Islâmica Síria, que defende a instalação de um Estado teocrático no país; e a Frente Al-Nusra, ligada à Al-Qaeda e cujo objetivo é formar um novo califado islâmico no Oriente Médio.
Existem ainda grupos curdos que atuam no norte do país e buscam a soberania em relação à Síria.
O impasse dos EUA em dar apoio armado mais consistente aos chamados rebeldes ocorre justamente pelo receio de armas caírem nas mãos das forças islâmicas contrárias aos estadunidenses. Tal situação poderia levar a uma continuidade da guerra mesmo após a queda de Al-Assad. Por outro lado, Al-Assad afirma que o apoio dos EUA à oposição é uma forma de fortalecer a própria Al-Qaeda.






Mapa político da Síria, indicando seus vizinhos




A similitude com os demais países que tiveram manifestações da Primavera Árabe manifesta-se na Síria com a interferência de outros países na resolução dos conflitos. Foi o apoio das forças ocidentais que levaram à queda de Gadaffi, por exemplo. Além dos EUA, apoiam os opositores sírios de Al-Assad a Turquia, Reino Unido, França, Arábia Saudita, Qatar e Israel. O apoio desses países acontece de várias formas, principalmente através do envio de armas e na facilidade de transporte delas através das fronteiras.
Apesar do isolamento do governo sírio, fortalecido após o apoio dado ao grupo islâmico libanês Hezbollah, em 2008, Al-Assad tem sido defendido pela Rússia, China, além do Irã, Líbano e Iraque.
A referência ao último país serve de gancho para falarmos sobre a segunda possibilidade de como o caso sírio pode ser retratado no vestibular. Pelo que foi exposto acima, a situação de intervenção dos EUA e países europeus no conflito traz à lembrança as invasões organizadas após o 11 de setembro de 2001, no Afeganistão e no Iraque. O fracasso na tentativa de troca de governos nesses países é latente, sendo que no Afeganistão o conflito ainda se desenrola, mais de dez anos após seu início, e com sérios reveses para os EUA.
EUA e Reino Unido pretendem não cometer o mesmo erro ocorrido com o Iraque, quando invadiram o país sem aval da ONU e utilizaram a argumentação de que Saddam Hussein detinha armas de destruição em massa, o que se mostrou como uma informação falsa pouco tempo depois. A tentativa de comprovação de uso de armas químicas, com gás sarín, por parte do exército de Al-Assad, em 21 de agosto de 2013, é um exemplo de como o governo de Barack Obama tenta justificar um ataque aéreo à Síria. Sem a comprovação, não há como acusar o governante sírio de crime contra a humanidade, única forma de obter o aval da maioria dos países da ONU para o ataque à Síria.



Júlio César Lázaro da Silva
Colaborador Brasil Escola
Graduado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista - UNESP
Mestre em Geografia Humana pela Universidade Estadual Paulista - UNESP

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